"You Want It Darker", ou como nos despedirmos do mundo, por Leonard Cohen

Ganha todo um outro sentido ouvir e escrever sobre "You Want It Darker" depois da notícia da morte de Leonard Cohen. As palavras custam a sair.

De cada vez que ouço o disco, emociono-me.
Não apenas porque é maravilhoso, mas porque sempre me acompanhou. E o meu mundo fica incrivelmente mais triste.

É inevitável encará-lo como uma espécie de despedida, o último da trilogia «espiritual» iniciada com "Old Ideas" e "Popular Problems".
As canções deste disco são (mais) um hino à vida que viveu, (mais) uma forma de nos fazer chegar a sua perspectiva sobre a (sua) espiritualidade, os seus demónios, o(s) seu(s) amor(es) - não consigo deixar de pensar que «You Want It Darker», o incrível tema de abertura, é o momento da reconciliação com Deus.


As palavras já não são apenas letras de canções, cada vez mais soa a poesia, belíssima e intensa. Como as de "Treaty", arrepiante do início ao fim e arrebatadora na versão «strings». Ou as de "If I Didn't Have Your Love", que aparecem como uma luz por entre a escuridão.


Em "On The Level" e "Traveling Light" dá-se o regresso aos sons que Cohen já nos habituou. E ao escutar "It Seemed The Better Way", há arrepios aos primeiros acordes de violino.

Os «strings» são de facto a jóia da coroa. Não faltam coros angelicais, e os instrumentais estão brilhantes como sempre. As linhas de guitarra são magníficas, as teclas estão carregadas de melancolia.
Mas são os violinos - como os de "Steer Your Way", simplesmente arrebatadores - que mexem com os nossos sentidos, com as nossas emoções. Que a espaços, são capazes de nos levar às lágrimas. Que tornam tudo mais luminoso, sem que a mística das canções de Leonard Cohen se perca.


A «culpa» é de um outro Cohen, o seu filho Adam. É dele o trabalho na produção, é por causa dele que a «despedida» tem outro encanto.

"You Want It Darker" é intenso, negro e denso. É triste, mas belo.
E é seguramente um dos discos do (meu) ano.

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