O Daniel no Sónar 2013

A edição de 2013 do Sónar em Barcelona teve lugar há algumas semanas e nós pedimos a um dos nossos amigos para nos contar como foi. Aqui fica a sua crónica:

«Estivemos no Sonar 2013.

Para os mais desatentos, o Sonar é o maior festival de música electrónica de Espanha e um dos maiores do mundo que este ano celebrou o seu 20º aniversário.

Para quem nunca lá foi, uma breve explicação de como funciona: O Sonar subdivide-se em dois grandes grupos: Sonar Dia e Sonar Noite. De dia, a música mais experimental e os laboratórios tecnológicos onde se apresentam as mais recentes inovações no campo da electrónica aplicada à música. Também é o local onde passam bandas mais soft e onde está baseado o Sonar Cinema. De noite, num local mais distante, actuam todas as bandas mais conhecidas.

Todos os anos, por meados de Junho, as ruas ficam apinhadas de gente freak vindas de todas as partes do mundo. De acordo com a organização, apenas um em cada quatro visitantes é espanhol. Os restantes, como tive oportunidade de constatar, vêm de sítios tão distintos como o norte da Europa ou o Extremo-Oriente. 

Antes de continuar, quero pedir desculpa se não fizer comentários às vossas bandas preferidas. A verdade é que a oferta é completamente alucinante e é de todo impossível cobrir a enorme quantidade de artistas e desfrutar de forma inteiramente sã. 


1º Dia 

O primeiro dia foi a uma quinta-feira e apenas houve Sonar Dia. Infelizmente, como me encontrava a trabalhar no recinto em regime de voluntariado, tive poucas oportunidades de acompanhar a coisa, para grande pena minha que queria escutar Sebastien Tellier. Ainda assim, pude dançar, enquanto o sol se punha, ao som de Lindstrom & Todd Terje, acompanhado de uma fresca cerveja (porque o dia ia bem quente). Estes tipos estavam claramente inspirados e não queriam que ninguém abandonasse o primeiro dia de festividades indiferente. A sua música electrizante (deixem-me passar a redundância da coisa) contagiou toda a audiência, a qual depois de uma tarde inteira a beber e a dançar respondia animadamente. 


2º Dia

Na sexta começaram os DJs e bandas mais sérias da coisa e foi também a primeira noite de Sonar Noite. Quanto a mim, terminei o dia de trabalho ao som de Modeselektor, num DJ set preparado para mais um pôr-do-sol. Uma vez mais, um final de dia perfeito e um começo de noite impecável. Era simplesmente impossível parar de dançar, mas a razão prevaleceu (Afinal de contas ainda não tinha bebido quase nada) e eu e os meus amigos constatámos que toda aquela gente que enchia o pátio iria eventualmente deslocar-se para o Sonar Noite e a coisa ia ficar complicada nos transportes. Saímos e fomos para o metro onde centenas de pessoas corriam e espremiam-se para caber dentro das carruagens. Ao fim de algum tempo, lá entrámos e deslocámo-nos para o outro pavilhão, onde depois de quase meia hora de fila (e eu tinha entrada Vip por pertencer aos acreditados – imaginem agora o resto) finalmente entrei.

Entre os vários artistas que iriam actuar, eu estava particularmente curioso com os alemães Kraftwerk. O seu espectáculo iria combinar música com um show 3D e a coisa parecia prometer. A questão é que, ou ainda era muito cedo para mim (22h) ou eu simplesmente não estava para aí virado porque a verdade é que, depois de uma hora eu estava já terrivelmente aborrecido com a frieza minimalista quase robótica destes alemães e um espectáculo 3D que desapontava (provavelmente tive alguns preconceitos relativamente à forma como os alemães tratam os sul europeus, quem sabe!).

Um dos meus maiores dilemas estava prestes a acontecer: na parte final de Kraftwerk iria começar Bat for Lashes e meia hora depois, enquanto eles ainda cantavam, começaria Nicolas Jaar, de longe o meu DJ preferido. Lá fomos a correr para o último palco, onde um pequeno grupo (deduzo que os Bat for Lashes ainda não sejam muito conhecidos ) os esperava. Infelizmente havia um problema com os esgotos e um cheiro péssimo erguia-se do subsolo o que tornava a experiência algo difícil. Contudo, isso não me demoveu. Havia muito que esperava vê-los, desde o lançamento do primeiro álbum: afinal de contas ter uma canção com o meu nome é qualquer coisa!

Ela foi querida. De vez em quando metia conversa com o público, mas eu tinha saído há pouco de um show de música quase de um futuro distante e o contraste com o som dos Bat for Lashes foi por demais evidente. Toda a energia que havia acumulado chegou ali e bloqueou, nos compassos lentos e relaxantes desta banda britânica. O público foi-se compondo aos poucos e acompanhava as letras. Mas o tempo passava, eu nunca mais escutava as canções que eu mais queria ("Daniel"e "Sirens") e Nicolas Jaar estava prestes a começar.Foi então que decidi deixá-los e ir escutar o chileno.

Nicolas Jaar, na minha mais humilde opinião, possui a batida mais elegante, moderna e requintada que há. Nunca nada é demasiado exuberante nem demasiado fora de contexto. O seu ritmo não é desnorteante nem cansativo, antes é uma modulação entre detalhes acompanhado de alguns picos de pura energia. Pessoalmente, o melhor da noite. E a casa veio abaixo quando tocou o clássico “Mi Mujer”.

Terminado Nicolas Jaar, foi tempo de uma coisa mais "comercial": Two Door Cinema Club. Esta banda irlandesa, sem dúvida alguma, foi até então a mais animada da noite. Desde o momento em que subiram ao palco até que o abandonaram, foram pura diversão. Sem espaço para músicas calminhas ou baladas mas sempre a bombar, nunca deixaram que a audiência parasse um momento para respirar. Todos saltavam, faziam 30 por uma linha, animados pela alegria exuberante da rapaziada. Ainda que não sejam senhores da música mais inteligente ou interessante do mundo, cumprem a 100% aquilo a que se comprometem: divertir quem os escuta. E ao fim de uma hora, o suor que percorria o meu corpo comprovava isso na perfeição.

Queria ter ficado até mais tarde, em especial para assistir a Skrillex mas só subiriam ao palco pelas 4h e eu na manhã seguinte iria trabalhar. A verdade é que, devido ao cansaço, acabei por me enganar no autocarro que me levaria a casa e terminei perdido atrás de um monte, junto a um hospital nos arredores de Barcelona, uma cidade tipo a Amadora cá do sitio e só cheguei a casa pelas 6h da manhã. Mais valia ter ficado para os ouvir!


3º Dia

Depois das minhas aventuras do dia anterior, comecei o sábado quase morto. Mas mesmo estando a trabalhar, não consegui deixar de pedir para ir assistir durante a tarde a uma das bandas que mais desejava ver: Chromatics. Já os havia escutado uma vez no Lux há um par de anos, aquando do lançamento do seu primeiro ou segundo álbum. Desta vez, já com mais um no bolso, pude notar que o tempo lhes fez bem: estão mais amadurecidos. O seu estilo musical não mudou mas a forma como compõem está agora mais solida. Sempre, na minha opinião, melancólicos e negros, foram perfeitos para se escutar calmamente durante a tarde, enquanto o sol brilhava fortemente e se recuperava das festas do dia anterior.

Contudo, tive de voltar ao trabalho. Felizmente, de onde estava, ainda podia acompanhar algumas coisas e posso dizer que a inglesa Mary Anne Hobbs que se seguiu não me convenceu. Quando finalmente piquei o ponto, juntei-me aos meus amigos para seguirmos para o pavilhão das festividades nocturnas.

Sábado era a noite em que os Pet Shop Boys, os cabeça-de-cartaz, iriam actuar. Esta dupla, mais antiga que o casamento dos meus pais, soube renovar-se ao longo dos anos e apresentou-nos um espectáculo animado ainda que repleto de clássicos remasterizados às sonoridades modernas. Para mim, que sou um amante incondicional de musica clássica (e agora vocês perguntam-se “como é então possível que gostes tanto de musica electrónica?”) não pude deixar de sorrir quando uma das suas musicas era composta por um remix da Sagração da Primavera de Stravinsky, obra que este ano celebra o seu centésimo aniversário desde a sua estreia em Paris em 1913 – e provavelmente fui dos poucos ali que se apercebeu disto.

Mas admito, duas horas de Pet Shop Boys era simplesmente demasiado para mim e fui ouvir uma coisa completamente oposta: Jurassic 5. Já tinha ouvido falar deles mas nunca os havia escutado. Hip Hop e variantes não são o meu género. Mas confesso que estes gajos sabem como animar uma audiência completamente à pinha. São divertidos e a sua música pôs toda a gente a dançar. Pessoalmente, foi a surpresa da noite.

Quando terminaram foi a vez do francês Breakbot, outro dos DJ que queria escutar. Não me desapontou. Mas quando estás acompanhado, em especial por raparigas que descobrem que afinal de contas no Sonar não passam a música que elas gostam (mas em que raio estariam elas a pensar?) acabas por ter de fazer algumas concessões e tive de mudar de pista. Acabei por deixá-las a descansar numa mesa e fui ter com outros amigos que estavam numa onda de divertir-se ao som de 2ManyDjs. Animados, bem se esforçaram, mas simplesmente já só os acho banais e sem nada que seja realmente interessante ou digno de nota.

Foi o tempo para algumas macacadas, refrescar a garganta, comer uns bolinhos e seguir para quem eu estava realmente à espera: Justice. Estes gajos sabem realmente o que fazem. Desde o início, com a abertura Also Sprach Zaratustra de Richard Strauss (incrível como a noite estava recheada de música clássica!) mais conhecida por aparecer no filme "2001: Odisseia no Espaço". Desde o momento em que começaram a tocar, foi uma sucessão de ritmos frenéticos, imparáveis e incansáveis. Foram provavelmente os mais enérgicos de toda a noite. Uma viagem alucinante de sons e modulações que ao fim de uma hora deixaram um publico morto de cansaço.

Mas a noite ainda não tinha terminado, havia ainda um último DJ que queria escutar: o alemão Paul Kalkbrenner. Este foi o encerrar de uma noite na perfeição. Quando já os pés começavam a ceder, a sua música começa a tocar e foi impossível ficar indiferente. Ritmos intensos, cobertos por uma luz quase lúgrebe, a sua música tocou-me de forma mais profunda do que à primeira vista anteciparia. Foi uma viagem de uma hora e meia onde se combinou excitação com momentos de pura reflexão e melancolia. Uma combinação bombástica de emoções que o tornaram, na minha opinião, o melhor da noite. Sem dúvida inesquecível.

Quando acabou, estava morto e parecia saído de "The Walking Dead". Foi a viagem até casa mais dura que me recordo, desde que vivo em Barcelona. Mas será sem dúvida também uma das melhores noites de sempre

Obrigada, Daniel, pela reportagem! :)

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