O mundo cantado por Courtney Barnett e Kurt Vile, em "A Lotta Lice"

Juntar duas das principais vozes indie e alternativas (que a esta altura de emergentes já não têm nada na verdade…) foi um golpe de mestre. Não só porque a própria musicalidade de Courtney Barnett é facilmente conjugável com a suavidade de Kurt Vile, mas porque a própria postura dos dois é muito semelhante.

A Lotta Lice, o álbum que junta estes dois nomes, é cheio de magia, auditiva pelo menos, e, apesar de não ser o sitio onde as minhas orelhas mais se sentem em casa, não há como negar que o álbum é bom.

Destaca-se, para mim, e logo de início, “Over Everything”, onde as vozes de Courtney Barnett e Kurt Vile casam de uma forma bonita, despretenciosa e suave, onde as guitarras mandam e dominam o som. A Lotta Lice vem cheio de coisas normais e bonitas, de duas pessoas que nos contam historias sobre a vida real. Do mais real possível.

Outro dos melhores momentos de A Lotta Lice é “Fear is Like a Forest”, mais eléctrica (electrónica?) e mais densa, uma música muito forte a todos os níveis, onde as próprias vozes dos dois ajudam a criar a densidade que acompanha a letra, que a mim me aparece sonoramente ligada com “On Script”, ainda que esta seja mais downtempo, com mais harmonias de guitarra. Em “On Script”, Courtney Barnett aparece mais forte e mais blasé, com a postura com que eu mais gosto de a ouvir. 

Não se pode falar em A Lotta Lice sem falar na música que o fecha: “Untogether”. Aqui sim temos um verdadeiro dueto, um que lhes fica mesmo bem. Um dueto em que Barnett e Vile mostram quem são, em que cada um mostra o que é, e em que se encaixam pelas características particulares de cada um e não enquanto organismo independente. É curioso ser esta a última musica do álbum, ou, se calhar é-o por isso mesmo.

Como eu já disse, A Lotta Lice é um disco muito simpático. Um álbum que celebra a amizade entre duas pessoas. Despretencioso e meio minimal, no sentido de ser exactamente aquilo que é. 

A Lotta Lice anda muito longe do chato e aborrecido, e demonstra mais uma vez o talento dos dois músicos, que fizeram uma data de boas canções acerca de coisas como queijo e afins, daquelas coisas reais da vida real. E fizeram-no só para se divertirem.

Eu confesso que, ainda assim, gosto mais do dueto que Kurt Vile fez com Hope Sandoval. E considero que Barnett é mais relevante que Vile, mas, repito, A Lotta Lice é, no geral, um bom álbum. Sem mais.

"...Books waiting to be written, Love is waiting to be loved, Songs here, underneath my fingers, Waiting to be sung...", em Fear is Like a Forest.