Linda Martini e o seu «Livro do Desassossego»


Estas linhas são escritas poucas horas depois de receber o novo disco dos Linda Martini. E por isso, está tudo ainda muito à flor da pele... A voz inquieta de André Henriques, a bateria estrondosa de Hélio Morais, as fabulosas linhas de baixo de Claúdia Guerreiro, as guitarras agressivas de André e de Pedro Geraldes, a violência das letras, a fúria, a raiva, o desassossego...



Mas vamos lá.




Gosto de discos que se iniciam com temas instrumentais. É como se nos quisessem preparar racionalmente - e porque não emocionalmente - para os que se seguem. Como se de um compasso se tratasse. "Ninguém tropeça nos dias" - tema de abertura brilhante - faz isso. Deixa-nos alerta para uma sonoridade forte e envolvente em "Turbo Lento", o terceiro registo dos Linda Martini.






A brutalidade de "Juárez" - o segundo tema, incrivelmente punk - é corrosiva. Um murro na mesa, o primeiro grito de revolta, o rock a querer ser de novo o despertar de gerações.



"Panteão" é inquietude, da letra ao instrumental. É genuína, mas incomoda cá dentro, revolta - «como um outro lado em nós, que nos vire do avesso, que invente um recomeço». Que nos encaminha para uma "Pirâmica" envolvente e arrepiante, com a voz de André a fazer-se ouvir no meio da batida, em jeito de canto de sobrevivência.

E depois chega-nos "Sapatos Bravos", intensa, imprevisível, forte, violenta. Para mim, o retrato maior deste "Turbo Lento".

Em "Febril (tanto mar)" regressa a raiva, a independência, o ser irrequieto, como o mar revolto, que depois acalma e nos abraça - na voz (emprestada) do grande Chico Buarque...




"Tremor Essencial" é a voz interior de cada um de nós, "Ratos", já tão conhecida e apreciada, é atual e assertiva - qual canção de intervenção do século XXI - e "Aparato", para mim uma das melhores do disco (a fazer lembrar Ornatos Violeta) - a letra, o instrumental, o ritmo, um turbilhão de emoções sob forma de canção.

Que se descarregam ao som de "Tamborina Fera", dois minutos de adrenalina pura, explosão em modo punk. Até que se faz ouvir "Volta", a canção que mais mexeu comigo. Desde a primeira audição do disco. É de novo o desassossego. Mas é também amor, honestidade, emoção. Uma melodia que arrepia, uma voz que nos envolve.


E de repente, ouvem-se os acordes de "Ninguém tropeça nos dias" e o disco termina. Na minha aparelhagem, recomeça; e eu penso: «"Turbo Lento" é um círculo perfeito».


"Não queiras ser como toda a gente/Não queiras crescer de repente/ que as rugas não são expressão"

(Linda Martini, em "Tremor Essencial")

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