EP do dia: "Hunted", Anna Calvi

Anna Calvi é uma das minhas miúdas preferidas nestas coisas da Música, é sabido. "Hunter", lançado em 2018 e que destaquei aqui, é provavelmente o seu disco mais arrojado e mantém-se incontornável no meu alinhamento, de tão delicioso.

"Hunted", o novo EP, recupera algumas das canções desse disco e apresenta-as num registo mais cru, mais intimista. A ideia surgiu quando Calvi, numa pausa das digressões, voltou a ouvir as primeiras gravações de "Hunter", gravações essas que captam a natureza pessoal e acústica (voz e guitarra) das canções. Partilhou-as com os seus artistas favoritos, e eles emprestaram as suas vozes e sensibilidade artística.
O resultado são 7 versões avassaladoras, das quais 4 contam com as preciosas participações de Julia Holter, Charlotte Gainsbourg, Courtney Barnett e Joe Talbot, o frontman dos IDLES.

"Hunter" deslumbrou-me com o seu lado primário e visceral, mas, neste EP, isso nota-se ainda mais. Há qualquer coisa de mágico em ouvir estas canções tão despidas. As emoções estão ainda mais à flor da pele, sentem-se desejos, necessidades, vontades.
Tudo em primeiro plano, a começar pela incrível voz de Anna Calvi, que em "Hunter", "Away" e "Indies or Paradise" soa ainda mais intensa, se tal for possível. São canções absolutamente desarmantes. A sensualidade, a emotividade, o fervor, a vulnerabilidade estão tão lá que nos deixam colados a cada nota, a cada palavra, a cada silêncio.

O mesmo acontece com as restantes.

Em "Swimming Pool", Anna faz-se acompanhar por Julia Holter, que traz uma espécie de encantamento à canção. O ambiente etéreo e "esfumado" levou-me a pensar em cantos de sereias quando tentam atrair marinheiros para o seu mundo. É assim tão fascinante.
"Eden", por seu lado, com Charlotte Gainsbourg, é maravilhosa. A canção transborda de romance, como se retratasse um encontro apaixonado entre duas pessoas que se complementam. É dramática e poderosa, ansiosa e ardente.

Já Courtney Barnett pegou em "Don't Beat the Girl out of My Boy" e o resultado é absolutamente incrível. A cumplicidade entre as duas sente-se em todos os momentos da canção, um constante diálogo delicado e impetuoso ao mesmo tempo.
"Wish" conta com a única presença masculina no EP, a de Joe Talbot, mostrando talvez que os homens também têm um lado vulnerável. Talbot continua a soar visceral e urgente mas também (e sobretudo) exposto, desarmado. O diálogo entre os dois é vigoroso, como que evocando o lado mais primário de cada um.

"Hunted", o EP, dá-nos uma outra visão sobre as canções de Anna Calvi, mas mantém-se no caminho traçado por "Hunter". É um disco visceral e sensual, como o anterior, mas, para mim, é mais instintivo e emotivo. É também (ainda) mais intenso, à «flor da pele». É um disco que nos prende a atenção e nos surpreende desde o primeiro momento e que merece ser ouvido sem pré-conceitos.