Concertinices sobre Discos: edição 2021 (I)

 
Fonte: Pinterest

Agosto é sinónimo de férias, e isso significa que houve tempo, finalmente, para pôr os discos em dia. Por isso, e, à semelhança do que tem acontecido nos últimos anos, eis então o primeiro capítulo da edição deste ano das «concertinices» sobre discos -  como também tem sido habitual, muitos ficaram de fora desta lista: ou não me entusiasmaram por aí além, ou, simplesmente, não colaram.

Vamos lá então?


A par dos Idles e dos Fontaines DC, os Shame encarnam bem o espírito do post-punk britânico. Assumo que, dos três, estes últimos são os que vão rodando com mais frequência, ainda que dependa muito do meu estado de espírito. O disco de estreia "Songs Of Praise" caiu que nem uma bomba, e este consolida o caminho traçado. Entre riffs estridentes, linhas de bateria ruidosas e poderosas, muito barulho e agressividade (por vezes em demasia para os meus ouvidos), surge sempre uma voz urgente, com tanto de turbulento como de provocador, e muito de visceral. Destaque maior para "Born in Luton" e "Station Wagon", tão diferentes entre si, mas com um sentido de inovação e de maturidade tremendo.



É, provavelmente, um dos discos do ano. Tudo nele soa bem e bonito, de tal forma que me é difícil escolher uma canção como favorita. A estreia da cantautora britânica revela um talento único para contar histórias, muitas delas duras, mas que nos chegam com uma leveza e uma gentileza tremendas, por entre melodias cuidadas e envolventes. É um disco melódicamente rico e líricamente poético, que não só nos comove como soa autêntico, com tanto de dor como de inspirador. E o melhor de tudo é, sem dúvida, a voz de Arlo Parks, celestial, dócil e reconfortante.



Mais uma estreia britânica bem conseguida, desta vez em septeto, que nos traz uma miscelânea de estilos, de instrumentos, e uma voz única. 6 canções que têm em si jazz, noise rock, prog rock e post-punk, por exemplo, que se fundem e se harmonizam em estruturas desconcertantes, tão tensas quanto libertadoras. A fluidez dos instrumentais é notória em "Sunglasses", que começa em passo lento, mas cresce para algo exuberante e ruidoso, e em "Opus" (que nos transportou para o universo de Kusturica), onde acontece o contrário. "Athens, France" com o seu registo jazzy é, para mim, a mais apelativa, mas é em "Track X" que os Black Country, New Road mostram todo o seu potencial, num instrumental poderoso, orgânico e experimental.



Ao quarto disco, os Django Django continuam igual a si próprios: irreverentes e disruptivos q.b., e regra geral, trazendo beats apetecíveis. Nem tudo neste disco colou, é certo, e nem sempre encontramos o maior imediatismo do disco anterior. Mas há coisas bem interessantes e bem conseguidas em "Glowing In The Dark". Gosto particularmente de "Waking Up", o luminoso e orelhudo tema que conta com a maravilhosa participação de Charlotte Gainsbourg. "Headrush" tem tanto de descomprometido como de urgente mas tem sobretudo uma linha de baixo pujante que nos prende e nos guia até ao fim. E a simplicidade de "The World Will Turn" parece destoar mas até soa como uma lufada de ar fresco no meio da cacofonia do disco, que, no geral, nos impele a mexer o esqueleto enquanto toca.



9 anos depois do lançamento de "Funny Looking Angels", eis que a dupla Tom Smith e Andy Burrows regressou aos discos. E ainda bem. O disco traz-nos canções melodiosas e bem executadas, com letras inteligentes e cáusticas, uma produção cristalina que nos permite escutar tudo o que se passa, uma dinâmica vocal surpreendente, e um ambiente fresco e divertido. Continuo a deliciar-me com "All The Best Moves", perfeita para dançar sem contenção, e com a intimista "Old TV Shows". "Parliament Hill" tem a voz maravilhosa de Smith pairando sobre acordes de piano nostálgicos, enquanto a de Andy balança tudo no refrão, e "Straight Up" fecha o disco em registo festivo. Esta última é talvez o exemplo máximo da cumplicidade e da química presentes na relação de Tom e Andy. Descontraído e confortável, é o disco perfeito para contrariar o ambiente soturno que nos assola de vez em quando.



São uma das bandas mais underrated do panorama musical britânico. Mas, a julgar pelo novo disco, colorido e ritmado, não se deixaram afetar por isso, aliás, vão mantendo a consistência e a relevância. "Nature Always Win" revela crescimento e maturidade, ao mesmo tempo que mantém a genica e o lado catchy e envolvente que lhes é tão característico. O novo disco é relacionável e incisivo, com canções bem feitas (refrões orelhudos, orquestrações ricas e letras impactantes) em que se sente a energia, o entusiasmo e a confiança da banda (agora reduzida a um trio). Nota máxima para a vibrante "Versions of You", a elegante "All of Me", e a tocante "Why Must a Building Burn?" (em referência ao incidente de Greenfell).



São uma das minhas bandas favoritas, apresentando sempre canções com carácter, emoção, ritmo, arranjos envolventes e vozes marcantes. Depois do festivo "Fever", "Sand" parece trazer-nos um registo mais descansado, como se fosse a banda sonora do pós-festa. Noto de imediato a veia jazzy em quase tudo, e que bem que soa... "Moment" marca o tom do disco, cheio de groove e de charme, "Losers" lembra o side project de Maarten Devoldere, Warhaus. "On A Roll" é sedutora, "Hourglass" encanta com a linha de baixo e os metais, ao passo que é o saxofone que agiganta "Leaving Antwerp". "Halfway" leva-nos ao R&B de Jinte Deprez no seu projeto a solo e "Powerless", relaxada e sugestiva, fecha o disco com chave de ouro - dá para perceber o quanto gosto disto, não dá? Sem dúvida, um dos meus discos de 2021.



Oitavo disco da carreira dos moços, com muitos altos e baixos, parece-me. Este, comparando com o anterior "Walls", soa melhor, mais orgânico, mais natural talvez (menos comercial, sem dúvida). A produção clean permite distinguir tudo ao pormenor: a linha de baixo tão incrível ao longo do disco, a sofisticação da bateria, as guitarras ao alto e a voz de Caleb sempre tão impressionante e única (ainda que me pareça mais contida). Nota mais positiva para "A Wave", "Golden Restless Age" e "Time In Disguise", ainda que "The Bandit" e "100,000 People", os singles, tenham a sua graça.



Os nossos "velhos" conhecidos de Gröningen lançaram o seu disco de estreia, do qual fazem parte o tema título "Looking For Faces", "In And Out", "Boy" e "Good Morning City, Now Let Me Sleep...", canções que fomos divulgando por aqui. Nas restantes, o indie pop/rock continua bem presente: são canções vibrantes e enérgicas, que fazem antever coisas explosivas ao vivo. Destaque maior para "Before Your Birth" e "Between The Bars", a primeira colocando no centro de tudo a voz distinta de Floris van Luijtelaar, e a segunda, uma versão brilhante para o original de Elliot Smith.



É o terceiro disco dos franceses, que me conquistaram com "L'Oiseleur" (ler aqui). Os poetas do rock, que revitalizaram a "Chanson Française", oferecem-nos um disco mais dançável, repleto de texturas eletrónicas e letras que variam entre o poético e o non-sense. O destaque maior vai, sem sombra de dúvida, para as interpretações de Artur Theboul, sempre eloquente e expressivo, entre o apaixonado e o incendiário. Rendi-me a "Avant qu'il n'y ait le monde" e a "La mer", ainda que "Un Monde Nouveau" continue a arrancar-me sorrisos.


[continua...]

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