Do Rock ao mítico trap de Chico da Tina, as memórias possíveis de um segundo dia de NOS Primavera Sound
Regressei ao Parque, como prometido, na golden hour. Porque tudo é mais bonito, porque tudo sabe melhor. Até os abraços com mais de 20 anos de espera. Cheguei para ver Slowdive, que, apesar de competentes e simpáticos, não nos convenceram e nos fizeram ir atras de mais. Até porque, numa noite que prometia acabar de forma épica, não se queria mais do que muito.
Na verdade, cheguei a tempo de pôr conversas em dia, de encontrar amigos e de, com calma, ir ver King Krule, que, apesar de nunca desiludir com a sua verdade e com a sua voz autêntica e cheia de power (e de ter cantado "Rock Bottom" e "Baby Blue"), estava diferente desde o nosso último encontro em Paredes de Coura, claramente mais experimental e mais crescido, fazendo-me ter uma ainda mais épica Golden Hour no Palco Cupra com o seu Rock-jazz-coiso, que me encanta sempre, e com a sua voz, vinda de dentro, do fundo das entranhas, que, invariavelmente, me seduz como poucas.
(King Krule, que viriamos a encontrar no fim da noite, no palco Binance, já "à civil", sempre com um sorriso e com uma simpatia que não enganam, e que o tornam ainda maior, e que faria já, horas antes, antever uma noite memorável.)
Sim, também fomos ver Beck (de quem eu nunca fui grande fã,), mas que demonstrou que, mesmo do alto dos seus 52 anos, continua fresco e airoso. Entreteve-nos e fez-nos viajar aos anos 90 e ao futuro, de forma graciosa e envolvente, trazendo a maior parte do público ao palco NOS, e, não desfazendo, fez-me viajar aos tempos de miúda, especialmente na parte final do concerto, alternando entre o Beck de agora com o de antigamente, com uma destreza que só tem quem faz as coisas muito bem feitas.
Mas, na verdade, a magia da noite do segundo dia de NOS Primavera Sound, para mim, começou quando, no Palco Binance, naquela clareira de abetos, carvalhos e plátanos, Jehnny Beth nos levou numa viagem sensorial de electro-punk-cenas. Poderosa como ela só, trouxe consigo o poder mágico de fazer música que toca, que faz sentir e que faz dançar.
Jehnny Beth partiu a louça toda e, mais uma vez e depois do fabuloso concerto que deu com Savages em 2016, mostrou que é um verdadeiro animal de palco e fez-nos esquecer o tempo e o espaço. Levou-nos, música após música a um universo cheio de sensações e de emoções como poucas pessoas conseguem, fazendo-me ter a certeza que o Rock está vivo e de saúde, e que ainda bem que ela sabe sempre tão bem o que fazer com ele.
Na verdade, Jehnny Beth surpreendeu-me mais uma vez, levando-me a um universo recheado de sons e de magia, como a boa música faz, mas, também no palco Binance, deu o mote ao que eu queria mesmo ver ontem (ou, no caso hoje, dado que ainda não fui dormir). Era chegada a hora de ver Chico da Tina, o miúdo que mistura a música popular com o Trap, que fala da sua realidade e com a sua verdade, não pretendendo ser mais do que muito bom, mas sendo, acima de tudo real, e com isso tocando todos os que o ouviram.
Se me tivessem contado que íamos estar a cantar músicas do cancioneiro popular português no NOS Primavera Sound, eu não ia acreditar, mas enquanto nos punha a cantar com ele, fazendo-nos libertar demónios e perder vergonhas de sermos exactamente quem somos, Chico da Tina foi como eu achei que ele ia ser: o maior.
Como eu digo sempre, chegar a casa cansada e feliz, significa que foi uma grande noite de festival. E, mais uma vez, isso aconteceu hoje no NOS Primavera Sound, porque tudo o que eu vi e ouvi, me tocou de alguma forma, e me acrescentou emoção, seja sentindo King Krule, Jehnny Beth ou Chico da Tina, três nomes, tão díspares quanto iguais na verdade que nos transmitem com a sua música.
Amanhã a coisa vai ser diferente, e vamos a um último dia de festival com outros nomes, outras vidas e outras memórias, e, sem querer pensar nisso, a maior parte do festival já foi, e já deixa saudades, como as boas coisas fazem, mas as memorias, essas que não se apagam e que nos fazem bem, ficam todas, nem que seja registadas em música.
Até amanhã!
Chavininha.
Sem comentários: